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quarta-feira, 9 de outubro de 2013

PSOL-RN A insustentável nova política de Marina Silva

por Edilson Silva

Marina Silva não venceu o único critério objetivo exigido pela legislação eleitoral para a criação de um partido político no Brasil: assinaturas comprovadas de 0,5% dos eleitores votantes para a Câmara Federal na eleição próxima passada. Não o conseguiu por opção, subproduto de arrogância e excesso de personalismo. Não ouviu ninguém na suposta rede horizontal que criou após sua saída do PV e nem os aliados e amigos próximos, que insistiam que não se conseguiria fundar e legalizar um partido em um único semestre. Fui testemunha presencial disso tudo.
 
Em política, a relação dialética entre comportamentos letárgicos e súbitos são o melhor esconderijo para quem foge de rótulos para não revelar sua essência também escondida. O resultado não pode ser outro que não a dissimulação como síntese. Nem esquerda, nem direita; nem situação, nem oposição; em 2010, no segundo turno, nem Dilma, nem Serra, nem nulo, nem branco – só se sabe que não ouve abstenção. “Morrerei com este segredo”, teria dito o “oráculo”, numa homenagem histórica ao voto secreto em tempos em que o homenageado deveria ser a transparência e o voto aberto, pelo menos por parte daqueles que se pretendem representantes do povo e protagonistas do novo.
 
Contando talvez com seu prestígio – inegável – e com a força das pesquisas que lhe colocavam como das principais postulantes à ocupante do cargo máximo do Executivo nacional, Marina apostou também em chegar ao pleno do TSE e ver esta Corte contornar o único critério objetivo exigido pela lei e que ela não cumprira. Mais uma vez a arrogância, tão bem travestida de humildade e vitimização, chegou primeiro. Para o bem do Estado de Direito, seja este democrático ou meramente liberal, o TSE foi rigoroso na observância da Lei. A lei é injusta? Pode ser e este é outro debate, necessário. O Brasil precisa sim de reformas políticas profundas, mas sem casuísmos eleitorais.
 
De posse de um não definitivo à legalização de seu partido para concorrer por ele à presidência em 2014, de novo o letárgico deu as mãos ao súbito. Da suposta não existência e da não admissão de se discutir sequer a possibilidade de um plano B diante de uma possível negativa do TSE – situação tão bem denunciada pelo deputado Alfredo Sirkys (PV-RJ), aliado de primeira hora de Marina – eis que surge o apoio à candidatura de Eduardo Campos à presidência da República e a filiação de Marina ao PSB em menos de 48 horas.
 
O gesto de Marina encaixa perfeitamente as peças de um quebra-cabeça que estava ainda incompreensível. Os que conhecem bem o estilo de fazer política do governador de Pernambuco viam com estranheza a sua ligeireza e açodamento no desembarque do governo Dilma, a forma como abriu mão dos irmãos Gomes no Ceará, o tudo ou nada estabelecido numa corrida presidencial em que pontuava entre 4% e 5% nas pesquisas, apenas. O gesto de Marina, então, já estava combinado e era o que dava segurança às movimentações firmes de Eduardo Campos. Nenhuma movimentação desta profundidade é construída em menos de 48 horas, tamanha as implicações, arranjos e segurança política exigida. Não é delírio supor que Eduardo Campos já tinha um entendimento com Marina Silva para o 1º turno, acenando para ser seu vice, caso ela legalizasse seu partido. A não legalização da Rede Sustentabilidade implicou na reciprocidade. Simples assim.
 
Para além de explicar o antes invisível e o agora tão óbvio, ao filiar-se ao PSB e hipotecar apoio ao projeto de Eduardo Campos, Marina apresenta um pouco mais sobre o que é sua essência política. Há aqui aspectos de natureza político-metodológica e político-programática, e são o que realmente interessa.
 
Os aspectos político-metodológicos não têm a ver exatamente com o que se pretende fazer, mas como se pretende fazê-lo. Mas como os fins – para quem não é maquiavélico – não justificam os meios, o como fazer faz sim muita diferença. Marina denuncia a velha política e se apresenta como um “novo jeito” de fazer política. Critica as oligarquias partidárias por serem legendas cartoriais, com donos que decidem tudo sozinho e em cúpulas. Critica também os partidos da esquerda e suas “guerras de crachás” em congressos e disputas acirradas.
 
O “novo jeito” de fazer política de Marina superou até aqui tudo isto para pior e é extremamente perigoso. Por certo é indesejável e condenável práticas como o neocoronelismo de Eduardo Campos, do PSB, que nomeia quem quer e retira quem quer do seu partido a hora que bem entender. Por certo também seria preferível ver os partidos de esquerda exercitando sua democracia interna em base a consensos e não em votações acirradas, mas, na falta de consensos, é bem melhor haver uma votação e o exercício de maiorias do que ver aparecer um cacique, aiatolá ou outra figura messiânica decidindo sozinho diante do impasse ou, no caso da Rede, uma liderança que desconsidera qualquer posição, majoritária ou minoritária, pois sequer há aferições, apenas “decantações” subjetivas de posições a serem interpretadas também subjetivamente pela liderança com ares de oráculo.
 
Marina decidiu sozinha quando e como seria fundado seu partido. Decidiu sozinha o plano B da Rede Sustentabilidade. Havia um plano C, D? Por certo, mas isto, também por certo, era de seu foro íntimo, assim como era o plano B. Seu novo jeito de fazer política se reduziu a comunicar aos seus “pares horizontais” – onde se encontram súditos tão leais quanto impotentes, eleitores fiéis, oportunistas de toda sorte, mas também incontáveis sujeitos tão honestos quanto ingênuos, todos tendo em comum a estratégia Marina e um nível impressionante de subserviência - as justificativas para as decisões que tomou. Caudilhismo e pragmatismo que “renovam” o mais velho e condenável na velha política.
 
Sobre os aspectos político-programáticos, estamos diante de mais um passo no aprofundamento das contradições de Marina. Temos no Brasil, a meu ver, quatro núcleos programáticos a serem tocados numa perspectiva transformadora no universo da política. Nova política econômica; Desenvolvimento sustentável anticapitalista; Aprofundamento da democracia; Aprofundamento da pauta dos direitos humanos.
 
Até 2010, Marina Silva já tinha se mostrado muito limitada nas questões econômicas e dos direitos humanos. Não se dispõe a enfrentar a questão fiscal, da dívida pública e dos banqueiros que sangram as finanças públicas. Não é proativa na defesa da pauta feminista e da população LGBT, por exemplo. Sua ida ao projeto de Eduardo Campos – cacique que de forma alguma é unanimidade no próprio PSB, que tem contradições internas e muita militância de esquerda – revela limites também na pauta democrática e também de desenvolvimento sustentável.
 
Lutamos em Pernambuco contra a instalação de usinas nucleares às margens do Rio São Francisco, proposta trazida entusiasticamente por Eduardo Campos. Lutamos para evitar a instalação do maior parque de usinas térmicas sujas de geração de energia elétrica do mundo a partir de combustíveis fósseis, cujo patrocinador foi Eduardo Campos. Lutamos para proteger a região de Suape, seus manguezais, seus pescadores, o turismo naturista, contra a lógica industrial suja e de crescimento do PIB industrial a todo custo, patrocinado por Eduardo Campos. Lutamos pela independência dos poderes da república, contra um governador que insiste em transformar o Estado e suas instituições em locais de acomodação da sua parentada. Poderíamos preencher páginas de exemplos. É a este projeto que Marina se associa politicamente.
 
O capitalismo contemporâneo debate-se nos últimos anos entre dois rumos, em meio à sua absoluta falta de consenso para onde ir diante de sua mais grave crise. Um desses rumos busca alongar a vida do capitalismo industrial, levando às periferias do sistema uma industrialização tardia, o que aprofundará a crise ambiental e trará para estas economias emergentes paradigmas políticos de pouca democracia e liberdade, é o que chamo de paradigma chinês. Eduardo Campos é, no Brasil, dos mais antenados e sintonizados com esta estratégia. Quis e quer, literalmente, transformar Pernambuco na China brasileira e “vende-se” como candidato a presidente para o empresariado com este diferencial.
 
O outro rumo apresentado pelo capitalismo é uma espécie de terceira revolução industrial, como preconizada por pensadores como Jeremy Rifkin, cujo último livro lançado no Brasil é prefaciado por ninguém menos que Marina Silva. Rifkin defende o início de um novo ciclo histórico de acumulação de capital, uma espécie de “Imperialismo Informacional” baseado num capitalismo verde, descartando gradualmente a Era Industrial e a financeirização desta Era.
 
Julgava eu que Marina Silva ao menos estivesse compromissada politicamente e eticamente com um rumo verde – impossível é verdade – nesta disputa de caminhos no interior do capitalismo, condição que ao constatar já me fazia vê-la como uma não alternativa política. Mas me enganei de novo e mais profundamente com ela. Sua adesão à candidatura de Eduardo Campos se coaduna com sua defesa do sistema financeiro e de mais arrocho nas concessões previdenciárias aos trabalhadores, com sua prática política de fazer acordos de cúpula na política, mas não pensei que chegasse ao ponto de associar-se ao “paradigma chinês”. Se sua adesão foi programática e não somente pragmática como ela mesma diz, o tiro não foi no pé, mas no coração.
 
Seria muito menos incoerente ter se associado a uma pequenina sigla para defender, de fato e como candidata a presidente, o seu utópico e irrealizável capitalismo verde. O que sobrou mesmo foi uma indisfarçável manobra política de essência antipetista e claramente na direção da reorganização de forças conservadoras no Brasil.

fonte:http://psol50.org.br/site/artigos-e-entrevistas/577/a-insustentavel-nova-politica-de-marina-silva

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